Em um momento crítico para a credibilidade das instituições democráticas, o julgamento ocorrido na tarde de quinta-feira (15/05/25) no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que analisa a perda do mandato do deputado estadual José Bernardo Ortiz Júnior, além de emblemático, é proporcional a um dos fatores mais corrosivos enraizados na política: a prática reiterada da infidelidade partidária e o uso de manobras estratégicas para a manutenção do poder “a qualquer custo”. Entenda o caso.
Entenda
Ortiz Junior, primeiro suplente a Deputado Estadual pelo PSDB nas eleições de 2022, desfiliou-se do partido para disputar em 2024, sem sucesso, a prefeitura de Taubaté pelo Republicanos. Após ser derrotado nas urnas, (3ª derrota consecutiva) o político tentou retornar ao PSDB para assumir uma vaga na ALESP – Assembleia Legislativa de São Paulo. No entanto, a tentativa esbarrou na legalidade e na ética: a legislação eleitoral proíbe o retorno à suplência em caso de desfiliação sem justa causa.
O caso Ortiz Júnior e o desprezo à ética partidária.
Como se não bastasse, a suposta refiliação ao PSDB foi feita de forma irregular, a manobra contou com integrantes de sua família e ainda seu ex-secretário de Esportes, Claudio Brazão (Macaé) que compunham o diretório municipal, ou seja, carente de imparcialidade. A refiliação foi considerada nula pela Executiva Nacional no dia 12 de dezembro de 2024. Ainda assim, no dia 6 de Janeiro de 2025, Ortiz Jr. foi nomeado deputado estadual, sem estar filiado a qualquer partido no momento da posse (segundo acusação da suplente Damaris Dias Moura Kuo e o parecer do Relator do julgamento), caracterizando uma clara violação da lei eleitoral. A irregularidade motivou não apenas a ação de cassação, mas também um mandado de segurança, ambos movidos pela segunda suplente da coligação, Damaris Kuo, em conjunto com o próprio PSDB.
A situação se agrava ainda mais quando, percebendo que não teria respaldo do PSDB, Ortiz Jr. migrou para o partido Cidadania no dia 25 de março, legenda federada ao PSDB, numa tentativa de driblar o sistema e evitar a perda do mandato. Essa movimentação revela um padrão: a política da conveniência, da infidelidade como método, da instrumentalização de partidos como meros abrigos temporários para interesses pessoais.
A defesa de Ortiz, por sua vez, tenta desviar o foco: alega perseguição interna no PSDB por seu voto a favor da expulsão do ex-deputado Aécio Neves. Evoca ainda princípios como o contraditório e a ampla defesa, citando jurisprudência do ministro Celso de Mello, como se questões processuais pudessem neutralizar o conteúdo ético do ato praticado.
Como está agora
O relator do processo, o Juiz Rogério Cury, foi objetivo e direto: considerou procedente a ação, reconheceu que Ortiz Jr. não estava filiado a nenhum partido político no momento da posse e ainda classificou a tentativa de validar a refiliação como uma burla deliberada às normas democráticas. O relator reconheceu também a legitimidade da suplente Damaris Kuo e determinou que ela seja empossada em até 10 dias, por direito e por coerência com o sistema proporcional. “No mérito, reconheço a ocorrência da desfiliação injustificada e julgo procedente a ação para decretar a perda do cargo de deputado estadual de José Bernardo Ortiz Júnior”: disse o relator
No entanto, quando a lógica e a lei indicavam o fim da situação que causa constrangimento, surgiu um pedido de vista feito pelo excelentíssimo Juiz Régis de Castilho, que acabou suspendendo o julgamento, e impedindo a efetivação da cassação e proporcionando fôlego temporário a um mandato que, aos olhos da lei e da moral, já não existe mais.
O caso Ortiz Junior não é apenas um episódio isolado. É um retrato fiel do que a política não pode mais tolerar: infidelidade partidária, manobras internas, desrespeito aos eleitores e desprezo pelas normas estabelecidas. Quando um parlamentar muda de partido para se beneficiar de uma eleição e tenta retornar à legenda apenas quando lhe é conveniente, não está defendendo a democracia, e sim corroendo suas bases.
A postura do PSDB ao expulsá-lo e a firmeza de Damaris Kuo ao buscar justiça judicialmente mostram que há resistência dentro do próprio sistema. Roga-se que haja também firmeza do Judiciário, para que a política volte a ser lugar de princípios e não de manobras.
O Brasil vive tempos de exaustão política. O cidadão já não reconhece na maioria dos seus representantes uma voz confiável, e episódios como este apenas confirmam o porquê. Quando a lealdade partidária se torna moeda de troca, quando mandatos são tratados como prêmios individuais e não como representação coletiva, não há democracia que se sustente sem rachaduras.
A Justiça Eleitoral tem agora a oportunidade de reafirmar os princípios que sustentam o sistema democrático. A cadeira que Ortiz ocupa não lhe pertence. Pertence ao projeto político que ele abandonou, ao voto do eleitor que confiou no PSDB e, sobretudo, à lógica mínima de coerência que ainda deve reger a política brasileira.
Este não é apenas um caso jurídico. É um teste de integridade para o sistema. E é hora de dizer, com clareza: infidelidade partidária não pode ser tolerada como prática recorrente. Ela é, antes de tudo, traição ao eleitor.
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